Mensagem especial da semana
Amélia Rodrigues
O entardecer lento deixava um debrum
em ouro iridescente sobre o cabeço dos morros, no lado oposto, que se refletia
sobre as águas tranquilas do lago.
O ar leve perpassava em sinfonia
branda, e, à medida que o velário da noite dominava a natureza, os astros
cintilavam ao longe, qual uma cantilena
de prata no zimbório infinito...
As pessoas comovidas dispersavam-se
em silêncio, envoltas nas profundas reflexões defluentes da mensagem ouvida.
De costas para o poente, na barca
encravada na areia de pedregulhos e seixos, Ele imprimira nas consciências
febricitadas e antes ansiosas o postal de Sua beleza incomparável, em contornos
de paz.
Enquanto falara, o Seu verbo eloquente,
cheio de calor e compreensão, caíra sobre cada ouvinte qual esperado unguento
colocado com carinho em purulenta ferida aberta em chaga viva...
Ampliando as balizas do reino de
Deus, profligara as alucinações argentárias, as ambições do mando arbitrário,
os exageros do prazer arrebatador...
Aquele povo sofrido que acorria á
praia, cada dia, a fim de ouvi-lO, conduzia ansiedades e paixões, anelando encontrar
a diretriz e a paz, a renovação e a segurança que lhe faltavam.
Saturado pelo desespero, sob o
impositivo das forças desatreladas da governança odienta e escravocrata que
gerava a fome e a revolta, padecia, também, da cegueira espiritual,
atirando-se, como desforço, à dor, aos abusos de toda espécie, perseguindo
ilusões...
Ouvindo-O, acalmavam-se as
inquietações, e uma aragem de renovação íntima lhe perpassava as paisagens
interiores.
Sem dúvida Ele era o Esperado...
Renovavam-se, cada tarde, as
multidões sedentas de esperança, à medida que Seus ditos e os Seus feitos
aumentavam o círculo dos informados, que chegavam mais ávidos, mais
necessitados.
*
Cercado por pequeno grupo de companheiros
que Lhe apresentavam questões pessoais, Ele refletia nos olhos profundos a
serenidade de quem conduz a paz, daquele que é a paz.
Acercou-se um jovem, canhestro e
constrangido, que não se podendo evadir do magnetismo que dEle se irradiava,
sem sopitar a onda de tormentos que o afligia, aproveitou-se de um ensejo que
se fez natural, e inquiriu tímido, porém sensibilizado:
- Acabo de ouvir-vos e a vossa
palavra penetra-me como afiado punhal...os conceitos me ardem na mente, como
brasa que queima e requeima...Desejei evadir-me, sair daqui e não pude...Eu que
já não tinha paz, acabo de perder a alegria ao escutar-vos...
Fez uma pausa e, logo, prosseguiu:
-Sou jovem, respeito os mandamentos;
no entanto, ambiciono pelo prazer, o gozo, porquanto minhas carnes vibrantes
anelam esse repasto até à lassidão... Pertenço a uma família abastada da
vizinhança e encontro-me em trânsito... Será possível a felicidade sem o
prazer?
Jesus olhou o jovem com a ternura eu
demorava exuberante na urna do Seu coração e refertava todos quantos dEle se
aproximavam.
Visitado por aquele dúlcido olhar, o
moço enrubesceu, acabrunhado.
Como se a Sua Voz se fizesse um
quase cicio, respondeu o Amigo:
- A felicidade que se usufrui gasta-se,
e a que se alicerça sobre o prazer se desmorona. Todo prazer imediato é
fugidio, porque se estriba na fragilidade dos sentidos físicos e estes sofrem
os impositivos das sensações que passam breves. Se procede das aspirações
nobres, constitui motivação para a renúncia e a abnegação a benefício da harmonia
duradoura. Quando inspirado no jogo devorador das sensações, arde e se apaga,
deixando impressões frustrantes, amargas...
“O prazer do corpo exige o repouso e
o prosseguimento, num crescendo sem limites, leva à exaustão, ao desgaste”.
“A felicidade, porém, se expressa
por um estado natural de paz e alegria sem altos nem baixos, distante das
explosões do júbilo e das quedas no desespero”.
- Como, então, não ambicionar o
amor, se ele, premiando o amante com o prazer, é a fonte do gozo?
- Refere-se à posse selvagem que se
confunde no gozo abrasador, não ao amor que comunga em espírito. O prazer real
decorre da vivência do amor que não entedia, enquanto o prazer da posse do amor
exaure e enfastia... Situando a felicidade no amor a Deus e ao próximo, desejo
conceituar o gozo não como finalidade em si mesma, mas como o próprio ato de
amar... Semelhante ao estuar de um botão de rosa que desabrocha e perfuma
simultaneamente, em derredor, o gozo do amor puro perdura no desabrochar do sentimento
e na fecundação que fomenta a vida...
- Sou jovem, Senhor! Ambiciono a
felicidade. Que me cabe fazer, se da alegria apenas conheço a sofreguidão dos
desejos?
- A juventude não é apenas uma fase
transitória do corpo, mas um estado de espírito. Quando a idade jovem se
compromete, o homem envelhece e se perturba num processo de decomposição
íntima. Indispensável amar, sem ferir em nome do amor, desejar sem impor,
esperar sem aflição e confiar sempre. Se o que consideras como tua felicidade
amargura outrem ou tisna a pureza do amor, esse sentimento não é verdadeiro,
nem fundamental: decorre da paixão infrene e degradante, que envilece e
passa...
- Eu, porém, amo e sofro...
- O verdadeiro amor não produz
sofrimento, porquanto sabe aguardar, não se precipita nem destrói nunca. É todo
feito de edificação do bem pelo bem geral. Se desejas amar a fim de que a
felicidade se te faça um estado real, renuncia hoje ao prazer entorpecente, e
semeia o bem para amanhã. O amor virá ao teu encalço, enquanto o tempo lenirá a
ansiedade do teu coração, apaziguando-te. Não ateies a chama dos desejos nalma
com fagulhas da ilusão no corpo...
O jovem silencioso fixou em Jesus o
olhar e, sinceramente comovido, balbuciou, desanimado:
- Compreendo-vos, Senhor,
compreendo-vos... É, todavia, muito difícil...
E afastou-se meditativo.
O Mestre acompanhou-o com o olhar
amoroso, enquanto o vulto da sua presença se diluía nas sombras da distância.
Seria essa a reação dos ouvintes por
muito tempo, até o dia longínquo em que anelassem pela felicidade real.
No alto, o céu de turquesa, com gemas de prata engastadas, era perene
pauta virgem em que Ele inscrevia as notas sublimes da excelsa melodia da Sua
Boa Nova, para o futuro dos tempos.
Psicografia
de Divaldo Franco do Livro Quando Voltar A Primavera
Mensagem fornecida pela FEP
Mensagem fornecida pela FEP
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AO SOM DE: MOMENTO ESPÍRITA - "AMOR"
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