Tema da semana:
“A infelicidade real”
de 23/04/2012 a 29/04/2012
Amélia Rodrigues
Toda sinfonia se distribui
por trechos melódicos que alcançam o esplendor em cada etapa, atingindo, por
fim, o majestoso, que é a culminância da peça musical.
Aquela era também uma
peculiar sinfonia de vida, modificando a estrutura de outras vidas. Atingia o
ápice em cada fase e recomeçava suavemente para lograr o máximo de beleza em
harmonia incomparável.
Sucediam-se as multidões,
como se fossem ondas do mar tangidas pelas mãos invisíveis de vento contínuo.
Chegavam e partiam,
trazendo aflições e levando o poema de sons e de esperanças para as diferentes
regiões de onde procediam.
Renovavam-se ao contato
com o jovem e belo Messias, tocadas pela magia da sua presença e pela força da sua
palavra.
Jamais alguém conseguira
penetrar uma lâmina de luz como aquela, no âmago dos sentimentos em sombras das
criaturas humanas, qual ele o fazia.
As palavras que enunciava
eram comuns; as lições, eram quase conhecidas, as atitudes eram convencionais;
no entanto, ninguém antes falara aquelas mesmas palavras conforme ele o fazia,
ou ensinara com a majestade com que o realizava, ou se apresentara com a
grandeza que lhe era natural.
Jesus, sem dúvida, era
especial.
D'Ele se irradiava
peregrina beleza que fascinava os sentimentos e inundava de alegria as
criaturas desesperadas. Poder-se-ia dizer que era semelhante a chuva gentil
sobre terra escaldante, ou brisa leve passando sobre ramagens paradas, ou
perfume suave impregnando o ar...
Era impossível permanecer
insensível à sua presença.
Ou o amavam, ou dominados
pela inveja, pelo ressentimento ante a sua beleza, a sua grandiosidade, o detestavam. Ninguém lhe ficava indiferente
ao encontro, desvelando o mundo íntimo ante o silêncio ou a voz que lhe
traduziam o momento.
Graças a essa força
magnética incomparável, ele se revelou o único na Terra que nunca teve alguém,
antes ou depois, que lhe equiparasse.
Surgira, fazia pouco, e
produzira uma revolução que se alongaria por todos os tempos do porvir, sem
interrupção nem desaparecimento.
Aqueles abençoados dias
ficariam imortalizados com a sua música na partitura da Natureza em perene
festa.
-o-
Quando a azáfama do dia
laborioso cessava, os seus amigos se reuniam na praia, na casa de Simão, sob a
copa das árvores frondosas, agasalhados pela escumilha das noites salpicadas de
astros lucilantes nela engastados, para continuar a ouvi-lo.
Noutras ocasiões,
terminadas as pregações, voltavam ao grupo, a fim de comentar as realizações e
solicitar esclarecimentos que lhes completassem a compreensão das ocorrências
que tiveram lugar durante o festival de misericórdia.
Jesus os ouvia exaltados
ou oprimidos e, paciente, falava-lhes com especial carinho, de forma que pudessem
entesourar os ensinamentos para o tempo de todos os futuros tempos.
Indagações variadas
surgiam em propostas, algumas estapafúrdias, outras assinaladas pelo sincero
desejo de romper a roupagem da ignorância na qual estorcegavam, ampliando as
dimensões do entendimento para melhor servir.
Foi numa dessas
oportunidades, após as ocorrências do atendimento a paralíticos e enfermos
outros que se recuperaram ao toque de suas mãos, que João, o discípulo amado,
se acercou, e, sensibilizado pelo vivo interesse de penetrar nos arcanos das
Divinas Leis, interrogou, ansioso:
- Por que, Mestre querido,
existe o sofrimento no mundo? Não nos poderia haver criado, o Pai Todo
Poderoso, sem limitações, nem angústias? Vejo o fórceps do desespero arrancando
os corações das criaturas do seu ergástulo no peito e fico-me a perguntar, qual
a razão para tanto padecimento?
Compreendendo a aflição
íntima do jovem sonhador, que desejava libertar as almas dos látegos que as
dilaceram, o Mestre compassivo esclareceu:
- Já viste o vento
paciente lapidando as montanhas, a fim de alterar-lhes os contornos, mas também
viste os raios arrebentando-lhes em choques poderosos e alcançando a mesma
finalidade. O córrego tranqüilo cava o leito suavemente, seguindo a superfície
da terra e modificando os seus acidentes, a fim de deslizar sem problemas, mas
corre que as tempestades descarregam catadupas que arrasam regiões e se
espraiam abrindo caminhos para escoar-se. O fogo devorador destrói o que
alcança, mas a lamparina mantém a claridade sem qualquer dano...
“Assim
também sucede com os fenômenos que convidam os seres humanos à transformação
moral.
“A
dor é mecanismo de purificação, como o fogo que derrete os metais que serão
transformados em utilidades. É fórceps, como disseste, que arranca da concha
grosseira o delicado ser que guarda, a fim de que ele atinja a sua finalidade
existencial.
“Fizessem-se
dóceis ao bem e ao próprio progresso as criaturas, e não necessitariam da força
ciclópica que explode em toda parte, a fim de as despertar e conduzir pelos
caminhos do dever.
“O
Pai Todo Misericórdia nos fez simples, destituídos de complicações, com os
atributos valiosos emanados do Seu amor, em forma de fascículo da Sua luz, a
fim de que cada qual, por sua vez, desenvolvesse essa força que lhes dorme
latente, ampliando-a ao infinito em cuja direção ruma.
“Porque
preferem o prazer ao dever, as satisfações imediatas aos investimentos de
sacrifício, fecham-se nos conflitos dos problemas que criam, quando se deveriam
abrir à claridade da ascensão. Não se deixam sensibilizar pelo amor, nem pela
beleza, pela harmonia vigente em toda parte, nem pela alegria, antes preferindo
as construções sombrias nas quais se refugiam, fazendo jus às conseqüências dos
atos insensatos, irresponsáveis...”.
Observando que os amigos
silenciaram, a fim de o ouvirem melhor, ele fez uma pausa oportuna, dando-lhes
ensejo de apreender o conteúdo das palavras, e logo prosseguiu:
- A vida é única e eterna,
mas as existências carnais são múltiplas. O espírito mergulha no corpo e dele
sai, pelos fenômenos da fecundação e da morte, sem que haja sido criado naquele
momento ou se desintegre no outro.
“Qual
uma semente pequenina que possui a árvore gigantesca no íntimo, aguardando a
oportunidade para desenvolvê-la, o Espírito carrega em germe a grandeza do Pai,
esperando as condições próprias para agigantar-se e atender a finalidade
superior que a aguarda.
“Insensíveis,
por enquanto, a essa mensagem de vida eterna, avançam, inconseqüentes, pelas
vias de perturbação, desatentos, produzindo males que lhes voltarão de maneira
diferente nas novas-futuras etapas, exigindo-lhes correção, reequilíbrio,
ajustamento.
“Nesse
momento, os camartelos do sofrimento são utilizados pela Vida, a fim de
despertar-lhes a consciência adormecida e demonstrar-lhes que o corpo, por mais
valioso e belo, é sempre transitório, e que o sentido da existência humana é
mais sério e grave do que pensam.
“Surdos
à delicada voz do amor, escutam o chamado tonitruante do sofrimento.
Indiferentes aos suaves apelos da brisa de ternura, atendem sob o medo da
tempestade.
“Desse
modo, são as próprias criaturas que elaboram o seu destino através dos
comportamentos que se permitem, recebendo de acordo com o que dão, colhendo
conforme semeiam. Todos têm as mesmas oportunidades e são aquinhoados com
iguais recursos, cabendo, a cada qual, a conduta que lhe pareça mais própria,
do que decorrerá a felicidade ou desdita futura”.
Novamente silenciou por um
pouco, de modo a ser entendido, para logo continuar:
- Eu venho despertar os
seres humanos para cumprimento dos seus deveres, demonstrando-lhes que tudo no
mundo é transitório, mas existe a vida eterna, que será conquistada a grande
esforço pessoal, sem privilégios nem aventuras. Cada um ascende com o esforço
dos próprios pés e conquista os espaços mediante os interesses investidos. Eu
venho dar a minha vida, para que todos tenham vida em abundância, no entanto, é
necessário que cada qual realize a sua parte para consegui-la.
“Sempre
que liberto momentaneamente alguém das amarras do seu sofrimento, em nome do
Amor, proporciono-lhe oportunidade para retificar o ontem de enganos, recuperar
o tempo que aplicou indevidamente, crescer em Espírito e vencer-se. Por isso,
recomendo-lhes que não voltem a pecar, para que não lhes aconteça nada pior.
“Somente
uma conduta correta merece uma vida feliz”.
E desejando encerrar a
questão, concluiu:
- O Pai deseja a
felicidade de todos os Seus filhos, e por essa razão mandou-me a eles, para
convidá-los à ascendência libertadora.
“Quanto
mais alto se está, mais ampla e atraente é a paisagem. Subir, todavia, exige
esforço. Sair das baixadas dos vícios para aspirar o ar puro das virtudes é o
desafio que se deve enfrentar e vencer.
“Eu
sigo à frente, porque sou o Caminho...”.
Respiravam-se as ânsias da
Natureza bordada de prata gotejante das estrelas longínquas, quando Ele
silenciou.
João, enternecido,
acercou-se mais e O abrtaçou com lágrimas nos olhos, falando-Lhe com voz
embargada:
- Eu seguirei contigo,
Amigo amado, até o fim, doando-te a minha pobre vida, para que possa ficar ao
Teu lado para sempre...
-o-
Os
séculos se dobaram sobre aquele momento inesquecível, e o discípulo amado,
dando prosseguimento fiel à promessa, retornou à Terra, nas roupagens de
Francisco de Assis, para convocar as criaturas distraídas a retomar o aminho do
nem, único, aliás, que a Ele conduz.
Do livro “Dias venturosos”.
Psicografia de Divaldo Pereira Franco.
Eu gostei muito da mensagem de Amélia Rodrigues, ela sempre nos faz viajar no tempo ao encontro do Divino Mestre. A mensagem que é sempre atual.
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