Tema da semana: “O homem
no mundo” de 12 a 18 de dezembro de 2011.
Irmão X
Conta-se que certo cristão de
recuados tempos, após reconhecer a grandeza do Evangelho, tomou-se de profunda
ansiedade pela completa integração com o Senhor. Ouvia, seguidos de paz
celeste, as preleções dos missionários da Revelação Divina e, embora tropeçasse
nos caminhos ásperos da Terra, permanecia em perene contemplação do Céu,
repetindo:
Jamais serei como os outros homens, arruinados e
falidos na fé! Oh! meu Salvador, suspiro pela eterna união
contigo!
De fato, conquanto não guardasse o fingimento do
fariseu, em pronunciando semelhantes palavras, fixava as lutas e fraquezas do
próximo, com indisfarcável horror. Assombravam-no os conflitos humanos e as
experiências alheias repercutiam-lhe na alma angustiosamente. Não seria
razoável refuriar-se na oração e aguardar o encontro divino? Figurava-se-lhe
o mundo velho campo lodoso, ao qual era indispensável fugir.
Concentrado em si mesmo, adotou o isolamento
como norma a seguir no trato com os semelhantes. Desligado de todos os
interesses do trabalho humano, vivia em prece contínua, na expectativa de
absoluta identificação com o Mestre. Se alguma pessoa lhe dirigia a palavra,
respondia receoso, utilizando monossílados apressados. Pesados tributos de
sofrimento exigia a vida de bocas levianas e insensatas e, por isso, temia oferecer
opiniões e pareceres. Nas assembléias de oração, quase nunca era visto em
companhia de outrem. Desviara-se de tudo e de todos na sua sede de Jesus
Cristo. À noite, sonhava com a sublime união e, durante o dia, consagrava-se a
longos exercícios espirituais, absorvidos na preparação do dia glorioso.
Nem por isso, contudo, a vida deixada de
acenar-lhe ao espírito, convidando-lhe o coração ao esforço ativo. No lar, no
templo, na via pública, o mundo chamava-o a pronunciamento em setores diversos.
Entretanto, mantinha-se inflexível. Detestava as uniões terrestres, desdenhava
os laços afetivos que unem os seres e, zombava de todas as realizações
planetárias e punha toda a sua esperança na rápida integração com o Salvador,.
Se encontrava companheiros cogitando de serviços políticos, recordava os
tiranos e os exploradores da confiança pública, asseverando que
semelhantes atividades constituíam um crime. À frente de obrigações
administrativas, afirmava que a secura e a dureza caracterizam a atitude dos
que dirigem as obras terrenas e, perante os servidores leais em ação,
classificava-os à conta de bajuladores e escravos inúteis. Examinando a arte e
a beleza, desfazia-se em acusações gratuítas, definindo-as por elemento de
exaltação condenável da carne transitória e, observando-a ciência,
menoscabava-lhe as edificações.
Unir-se-ia a Jesus, - ponderava sempre – e
jamais entraria em acordo com a existência no mundo.
Se companheiros abnegados lhe pediam colaboração
em serviços terrestres, perguntava:
Para quê?
E acrescentava:
Os felizes são bastante endurecidos para se
aproveitarem de meu concurso, e os infelizes bastante desesperados, merecendo,
por isso mesmo, a purificação pela dor. Não perturbarei meu trabalho, seguirei
ao encontro de meu Senhor.
E de tal modo viveu apaixonado
pela glória do encontro celeste que se retirou, um dia, do corpo, pela
influência da morte, revestido de pureza singular. Na leveza das almas
tranqüilas, subiu, orgulhoso de sua vitória, para ter com o Senhor e com Ele
identificar-se para sempre.
No esforço de ascensão, passou por velhos
desiludidos, mães atormentadas, pois sofredores, jovens sem rumo e espíritos
informados de todas sorte... Não lhes deu atenção, todavia. Suspirava por
Cristo, pretendia-lhe a convivência para a eternidade. Peregrinou dias e
noites, procurando ansiosamente, até que, em dado instante, lhe surgiu aos
olhos maravilhados um palácio deslumbrante. Luzes sublimes banhavam-no todo e,
lá dentro harmonias celestes se fazem ouvir em deliciosa surdina.
O crente ajoelhou-se e chorou de júbilo intenso.
Palpita-lhe descompassado o coração amante. Ia, enfim, concretizar o longo
sonho.
Contudo, antes que se dispusesse a bater junto à
portaria resplandecente, apareceu-lhe um anjo, diante do qual se prosterna,
extasiado e feliz. Quis falar, mas não pôde. A emoção embargava-lhe a voz.,
todavia, o mensageiro afagou-lhe a fronte e exclamou compassivo:
Jesus compadeceu-se de ti e mandou-me ao teu
encontro.
Estamos no Reino do Senhor? – inquiriu,
afinal, o crente venturoso.
Sim, respondeu o emissário angélico, - temos à
frente o início de vasta região bem-aventurada do Reino.
Posso entrar? – indagou o cristão
contente.
O anjo fixou nele o olhar melancólico e
informou.
Ainda não meu amigo.
E ante o interlocutor, profundamente decepcionado,
continuou:
Realizaste a fiel adoração do Mestre, mas não
executaste o trabalho do Pai. Teu coração em verdade palpitou pelo Cristo,
entretanto, Jesus não se enfeita de admiradores apaixonados como as árvores que
se adornam de orquídeas. Não pede cortejadores para a sua glória e sim espera
que todos os seus aprendizes sejam também glorificados. Por isso, em sua
passagem pela Terra nunca se afirmou proprietário do mundo ou doador das
bênçãos. Antes, atendeu a todos os sublimes deveres do serviço comum e convidou
os homens a cumprir os superiores desígnios do nosso Eterno Pai. Não deixou os
discípulos diretos, aos quais chamou amigos, na qualidade de flores ornamentais de sua
doutrina e sim na categoria de sal da Terra destinado à
glorificação do gosto de viver.
Estabelecera-se longa pausa
que o mísero desencarnado não ousou interromper. O mensageiro, porém,
acariciando-o, com bondade, observou ainda:
Volta, meu amigo, e completa a realização
espiritual! Não procures Jesus como admirador apaixonado, mas inútil...
Torna ao plano terrestre, luta, chora, sofre e ajuda no círculo dos outros
homens! A dor conferir-te-á dons divinos, o trabalho abrir-te-á portas
benditas de elevação, a experiência encher-te-á o caminho de infinita luz e a
cooperação entregar-te-á tesouros de valor imortal! Não necessitarás,
então, procurar o Senhor, como quem busca um ídolo, porque o Senhor te
procurará como amigo fiel! Volta e não temas!
Nesse momento, algo aconteceu de inesperado e
doloroso. Desapareceram o palácio, o anjo e a paisagem de luz... Estranha
escuridão pesou no ambiente e, quando o pobre desencarnado tornou a sentir o
beijo da luz nos olhos lacrimosos, encontrava-se, no mesmo lar modesto de onde
havia saído, ansioso agora por retomar o trabalho da realização divina noutra
forma carnal.
Livro “Coletânea do Além”
Psicografia de Chico Xavier – Autores Diversos
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